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Lei do Paraná estabelece o direito ao atendimento pessoal nos serviços de TV por assinatura: análise de sua constitucionalidade sob ângulo das competências federativas
O presente texto comenta a lei paranaense que impõe às empresas prestadoras de serviços de TV por assinatura a obrigação de manter escritórios regionais para fins de atendimento pessoal aos clientes.[1]
Conforme estabelece a referida lei estadual: “as empresas prestadoras dos serviços de TV por assinatura situadas no Estado do Paraná deverão instituir um escritório regional para atendimento pessoal nas microrregiões para cada grupo de cem mil habitantes”. E, ainda, que: “O referido escritório deverá disponibilizar funcionários para efetuar atendimento pessoal aos clientes”. Na hipótese de descumprimento desta regra são aplicáveis as sanções do Código de Defesa do Consumidor.
A fundamentação da Assembleia Legislativa do Paraná para justificar o projeto de lei é a seguinte: (i) o direito do consumidor à qualidade dos produtos e serviços das empresas de TV por assinatura; (ii) a insuficiência dos serviços de call center para atendimento às reclamações dos consumidores e (iii) a obrigatoriedade do escritório regional em garantia da agilidade no atendimento aos cidadãos.
O projeto de lei originário foi vetado pelo Governador do Estado do Paraná com fundamento na competência privativa da União para legislar sobre serviços de telecomunicações. Nas razões do veto afirma-se que a competência legislativa concorrente sobre direito do consumidor não pode se sobrepor à competência privativa federal para legislar sobre telecomunicações. O veto ao projeto de lei foi derrubado pela Assembleia Legislativa, e a lei foi publicada. A sua vigência está datada para 28 de dezembro de 2013.
Embora em vigor o princípio da presunção da constitucionalidade das leis, cabe verificar que, em especial ante a divergência apresentada no veto, a constitucionalidade da lei estadual em foco pode ser questionada e desencadeada a jurisdição constitucional. Daí o presente texto tem o propósito de esclarecer as possíveis teses jurídicas a respeito da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da mencionada lei paranaense quanto ao aspecto das competências federativas para legislar sobre o tema.[2]
A matéria relacionada ao direito ao atendimento pessoal nos serviços de televisão por assinatura, disciplinada pela lei estadual em análise, envolve conflito entre as regras constitucionais que tratam da competência legislativa dos entes federativos.[3] De um lado, a competência da União para legislar privativamente e explorar serviços de telecomunicações, nos termos do art. 22, IV, da Constituição. De outro lado, a competência dos Estados-membros para legislar concorrentemente sobre produção e consumo, com fundamento no art. 24, V, da Constituição. Com efeito, ao vetar o projeto de lei, o Governador do Estado do Paraná adotou interpretação sob a perspectiva da competência privativa da União para legislar sobre os serviços de telecomunicações, ao promover o enquadramento do caso do atendimento pessoal aos assinantes nos serviços de televisão por assinatura. Diferentemente, a Assembleia Legislativa optou pela interpretação sob o ângulo da competência legislativa concorrente estadual na disciplina sobre produção e consumo.[4]
A lei estadual paranaense adota a tese da competência concorrente dos estados-membros para legislar sobre direito ao atendimento pessoal ao usuário dos serviços de televisão assinatura. Parte-se do pressuposto da existência de uma relação de produção e consumo nos serviços de televisão por assinatura, o que justificaria a atuação legislativa estadual em proteção aos consumidores.
Diversamente, o veto defende competência privativa da União para legislar sobre serviços de telecomunicações. Sob esta outra perspectiva há vício formal na lei em decorrência da incompetência do estado para legislar sobre o tema, o que implica em sua inconstitucionalidade.
Para além das razões do referido veto, analisando-se o caso no seu contexto mais detalhadamente, pode-se argumentar que a especialidade da matéria justifica a competência regulatória privativa da União e, por consequência, a regulação federal sobre o regime jurídico dos usuários dos serviços de telecomunicações. Assim, diante da especialidade da matéria de telecomunicações seria afastada a incidência do direito consumerista e aplicada a competência da União para disciplinar, privativamente, o setor.[5] Aliás, a própria Constituição prevê a instituição de órgão regulador do setor de telecomunicações: a Agência Nacional de Telecomunicações.[6] Dentre suas diversas atribuições, está a função normativa para regular as relações entre os usuários dos serviços de comunicações e as respectivas empresas que atuam no setor. Ou seja, a partir do contexto legal, criar e garantir direitos e obrigações das pessoas.[7] Nesta linha de entendimento, a competência privativa federal é justificada para preservar a unidade da regulação jurídica e econômica para todo território brasileiro. A finalidade é evitar sobreposição de normas sobre mesmo tema e o estado de insegurança jurídica no setor regulado.[8]
Cumpre destacar que os serviços de televisão por assinatura, espécie de serviços de telecomunicações, atualmente classificados como serviços de comunicação audiovisual de acesso condicionado, são objeto de regulação federal pela Lei 12.485/2011. O referido marco regulatório do setor classifica os serviços como atividade econômica sob regime da autorização administrativa.[9] Os serviços de comunicação audiovisual de acesso condicionado (TV por assinatura) não são, portanto, considerados como serviços públicos.[10] Não há contrato de concessão entre a União e as empresas prestadoras dos serviços de comunicação audiovisual.
A referida lei federal dos serviços de televisão por assinatura não prevê o direito ao atendimento presencial dos assinantes dos serviços.[11]
Porém, no âmbito infralegal, a Resolução da Agência Nacional de Telecomunicações impõe à prestadora dos serviços de TV por assinatura a obrigação de manter em sua área de atuação, ao menos, um centro de atendimento que ofereça atendimento pessoal, de modo presencial, nas localidades onde exista ponto de venda do serviço ofertado.[12]
Em síntese, quanto ao controle de constitucionalidade da lei estadual em exame, existem duas alternativas à interpretação constitucional das regras de competência legislativa se privativa da União ou concorrente com a do Estado-membro.
Primeira alternativa, a tese da competência do estado-membro para legislar sobre este tema sob o fundamento da competência legislativa concorrente. Nesta hipótese, necessariamente a jurisdição constitucional deverá verificar a incidência do art. 24, inc. V e os parâmetros para o controle de aplicação da competência concorrente previsto nos §1, §2, §3 e §4.[13] Ou seja, deve-se verificar a existência de normas gerais na legislação federal sobre o assunto e a compatibilidade com a lei estadual. E na hipótese de existência de configuração de lei federal sobre normas gerais haverá a suspensão dos efeitos da lei estadual no que lhe for contrário.[14] A princípio, também pode ocorrer a coexistência da lei federal com a lei estadual desde que seus respectivos conteúdos sejam compatíveis. Se adotada esta tese, os estados-membros poderão legislar sobre esta matéria, o que provavelmente criará um cenário de diversidade de regimes jurídicos em todo o País a respeito dos direitos dos usuários dos serviços. Uma solução interpretativa neste sentido conduz à afirmação da competência do estado-membro para proteger os consumidores alocados em seu território suplementarmente à proteção federal.[15] Mas, delimitado o âmbito de incidência da lei estadual, evidentemente, ao território do estado-membro.[16]
Segunda alternativa, a tese da competência privativa da União para legislar sobre serviços de telecomunicações, inclusive a espécie serviços de comunicação audiovisual de acesso condicionado. Aqui, se prevalecer a tese em sua integralidade, então, necessariamente a lei estadual deverá ser declarada inconstitucional por invasão à competência da União para legislar sobre o tema. Consequentemente, preserva-se a unidade regulatória em termos de regime jurídico dos usuários dos serviços de comunicações em mãos da União, seja diretamente ou mediante a agência reguladora das telecomunicações.[17]
O caso em foco da lei estadual paranaense sobre o direito ao atendimento pessoal nos serviços de televisão por assinatura tem significativa repercussão do ângulo constitucional.
A tese jurídica subjacente à lei estadual centrada no exercício da competência legislativa concorrente do estado-membro para tratar do tema é inovadora e desafiadora da intepretação tradicional, razão pela qual enseja controvérsias, e inclusive pode ocasionar o controle de sua constitucionalidade.[18] O tema é relevante porque envolve a reflexão sobre a função das competências federativas na regulação dos serviços, o regime jurídico de proteção aos usuários dos serviços de comunicação audiovisual e a fonte de criação de direitos e obrigações, se lei federal e, suplementarmente, a lei estadual. Enfim, desperta o saudável debate democrático sobre as tendências de centralização normativa (unidade regulatória) ou descentralização normativa (pluralidade e diversidade regulatória).[19]
[1] Cf. Lei 17.663/2013, Publicada no Diário Oficial do Estado do Paraná em 30/08/2013. Segue o texto integral da lei:
“Art. 1. As empresas prestadoras de serviços de TV por assinatura situadas no Estado do Paraná deverão instituir um escritório regional para atendimento pessoal nas microregiões para cada grupo de cem mil habitantes.
Art. 2. O referido escritório deverá disponibilizar funcionários para efetuar atendimento pessoal aos clientes.
Art. 3. O descumprimento do disposto nesta Lei implicará nas sanções previstas no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor, Lei Federal 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Art. 4. O Poder Executivo regulamentará a forma de fiscalização.
Art. 5. Esta lei entra em vigor no prazo de cento e vinte dias a partir de sua publicação”.
[2] O tema revela diferentes perspectivas em termos de lógica jurídica: a) visão exclusiva: União tem a competência exclusiva para expedir normas sobre tema; b) visão compartilhada : tanto União quanto os Estados-membros compartilham da competência legislativa para emitir normas sobre o tema, cabendo à União as normas gerais e aos Estados as normas especiais conforme peculiariedades locais.
[3] Por outro ângulo de análise, a questão da criação do direito ao atendimento pessoal nos serviços de televisão por assinatura também envolve o conflito entre os princípios constitucionais da livre iniciativa e a defesa do consumidor. Porém, devido aos limites do presente texto, aqui não há como focar esta outra dimensão.
[4] Registre-se que o tratamento normativo em projetos de leis estaduais do direito ao atendimento pessoal em serviços de telecomunicações repete-se em outras unidades da federação brasileira, daí a relevância de sua análise. Por exemplo, no Estado de São Paulo, a Assembleia Legislativa apresentou o Projeto de Lei n. 632/2008, que obriga as prestadoras de serviços públicos ao atendimento aos consumidores nas modalidades presencial, telefônico, postal e pela internet, com a inclusão, entre outros, dos serviços de televisão por assinatura. Mas, o Governador do Estado vetou o dispositivo sob o argumento da competência privativa da União para tratar da matéria relacionada aos serviços de telecomunicações. Até o momento da conclusão deste artigo, segundo informações do site da Assembleia Legislativa de São Paulo, o veto não havia sido apreciado.
Ademais, cabe lembrar que, especificamente, no caso dos serviços de telefonia fixa, a ausência do atendimento pessoal motivou diversas ações civis públicas contra as empresas concessionárias dos referidos serviços, o que resultou em termo de compromisso para a implantação de unidades de atendimento aos consumidores. Ver: II Simpósio dos Direitos dos Consumidores nas Telecomunicações. Coordenação Ministério Público Federal: organização Fórum Latino-Americano de Defesa do Consumidor: Porto Alegre, RS: AGE, 2013.
[5] Este ponto de vista é seguido pelo Min. Dias Toffoli, do STF, na ADI 4.478/AP, de 01.09.2011, em julgamento da constitucionalidade de lei do Estado do Amapá que tratou da proibição da cobrança de assinatura básica nos serviços de telefonia fixa e móvel. Em seu voto como razão de decidir: “Há, no caso, um regramento todo específico e especial e, ainda, uma novidade no nosso ordenamento, que é o órgão regulador do setor. Há quatorze, quinze anos, da criação dos órgãos reguladores, nós temos que iniciar o seu fortalecimento e a compreensão do que significa esse órgão regulador, gerindo conflitos existentes entre os concessionários e os consumidores, os usuários do serviço. Essa especialidade expressada no texto constitucional, a meu ver, já é suficiente para, em matéria de telecomunicações, afastar a incidência do direito consumerista e atribuir à União a competência privativa para disciplinar, privativamente, o setor, nos termos do art. 22, IV, da Constituição da República.
Na ADI 4.478/AP, o STF, por maioria, entendeu no sentido da inconstitucionalidade da lei estadual em decorrência da competência privativa da União para legislar e prestar os serviços públicos de telecomunicações.
Diversamente, neste caso, em voto vencido o Min. Carlos Ayres Britto, ao negar a incidência da competência federal privativa da União por não se tratar de matéria de telecomunicações, manifestou-se no sentido da constitucionalidade da lei estadual por entender pela incidência da competência legislativa concorrente, conforme o art. 24 da Constituição. Em seu voto, seu argumento foi no seguinte sentido: “É nesse contexto normativo de elevação de defesa do consumidor a princípio constitucional que se deve ter em mente que a lei estadual em análise incide mesmo é sobre relações tipicamente de consumo, independentemente do objeto contratual a ela subjacente (prestação de serviços de telefonia fixa e móvel). (…) Sendo assim, não há usurpação legislativa no fato de lei estadual proteger, no âmbito de seu raio territorial de incidência, consumidor-usuário de serviços de telefonia. Proteger, entenda-se, mediante a regra de que é só é permitido o pagamento pelo efetivo uso mensal dos serviços contratados. (…). Percebe-se, pois, que a lei estadual adversada não implica senão legítima atuação normativa de prevenção de danos aos consumidores-usuários do Estado do Amapá, tal como expressamente admitido nos incisos V e VIII do art. 24 da Constituição. Modo conciliado de repartir a competência para conformar, legislativamente, a atividade técnica em si mesma de telefonia com o poder que assiste ao Estado-membro de proteger os consumidores alocados em seu território suplementarmente à proteção federal”.
[6] A lei federal de criação da ANATEL lhe atribui competência normativa para regular os serviços de telecomunicações. Uma das características centrais da agência é a especialização técnica sobre o setor objeto da regulação, para fins de eficiência em suas práticas regulatórias. O objetivo da regulação é garantir o equilíbrio dos diversos interesses do mercado e serviços regulados. Uma de suas funções é corrigir a falha de mercado e garantir a proteção eficaz dos usuários/consumidores dos serviços. As deficiências na prestação dos serviços no mercado é que demandam a intervenção do direito regulatório. Daí a justificação plena da existência de regra sobre o direito o atendimento pessoal nos serviços de televisão por assinatura. Trata-se de regra de estruturação do mercado e, simultaneamente, de comportamento quanto à organização dos serviços para o público. Ademais, trata-se da instituição do direito de autodefesa do usuário diante das empresas que atuam no mercado de comunicação. Se a prestação dos serviços fosse eficiente e adequada seria desnecessária a edição desta espécie de regra de proteção ao usuário. Além disto, diante do cenário de tecnologias de comunicação à distância (call center e internet), poder-se-ia objetar no sentido da desnecessidade do atendimento pessoal ao cliente. Porém, diante dos fatos notórios da realidade brasileira da ineficiência dos serviços à distância, percebe-se claramente a necessidade do atendimento presencial. Ainda mais para aquelas pessoas que não têm acesso às tecnologias ou não estão adaptadas à respectiva utilização. E, ainda, cumpre destacar que os custos de transação nas relações jurídicas decorrem das falhas no funcionamento dos próprios serviços. Ao usuário, seja pessoa física ou pessoa jurídica, é transferido o custo de defesa de seus direitos. Daí uma vez mais a necessidade de medidas de atenuação destes custos e em garantia ao bem estar mínimo aos clientes.
[7] Além disto, cabe destacar que o ambiente regulatório do setor das telecomunicações é integrado por diferentes modalidades de serviços e regime jurídicos diferenciados. Assim, os serviços de telefonia fixa encontram-se no regime público de concessão. Os serviços de telefonia móvel estão no regime privado da autorização. Por sua vez, os serviços de comunicação audiovisual de acesso condicionado (TV por assinatura) estão no regime privado da autorização. Os serviços de comunicação multimídia (de acesso à internet) encontra-se no regime privado. Cada regime jurídico contém direitos e deveres diferentes para os respectivos usuários dos serviços. Diante do cenário de convergência dos serviços de comunicações estuda-se a instituição de regime jurídico uniforme a todas as espécies de serviços de comunicação.
[8] Conforme lições de Konrad Hesse ao tratar do âmbito da legislação concorrente:
“A federação tem, nesse âmbito, o direito de legislar somente se, e na medida em que, a produção de condições de vida equivalentes no território federal ou a conservação da unidade jurídica ou econômica no interesse estatal-total torna necessária uma regulação legal-federal”. In: Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha. Tradução Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, p. 194.
[9] A Lei 12.485/2011 é objeto de diversas impugnações em ações diretas de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal. A mudança do regime jurídico da concessão para a autorização é questionada nas Adins 4679, 4677 e 4756, ainda em julgamento no STF, até o momento da conclusão deste artigo.
[10] Ver: SCORSIM, Ericson Meister. TV por Assinatura: Serviço de Acesso Condicionado. Revista de Direito das Comunicações, v. 5, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 65-96, 2012.
[11] A Lei da Comunicação Audiovisual (TV por Assinatura) trata dos direitos dos assinantes em seu art. 33, limitando-se aos seguintes: conhecer, previamente, o tipo de programação a ser exibida; contratar com a distribuidora do serviço de acesso condicionado os serviços de instalação e manutenção dos equipamentos necessários à recepção dos sinais; relacionar-se apenas com a prestadora do serviço de acesso condicionado da qual é assinante; receber cópia impressa ou em meio eletrônico dos contratos assim que formalizados; ter a opção de contratar exclusivamente, de forma onerosa, os canais de distribuição obrigatória de que trata o art. 32.
Tramita na Câmara dos Deputados o PL 6223/2013, para incluir o direito ao atendimento presencial aos assinantes dos serviços de acesso condicionado na Lei 12.485/2013. A título ilustrativo, também a Lei Geral das Telecomunicações não contém esta modalidade de direito do usuários dos respectivos serviços de telecomunicações.
[12] Cf. Regulamento da Anatel de Proteção aos Assinantes dos Serviços de TV por assinatura, aprovado pela Resolução 488/2007, ratificado pela Resolução 581/2012. O texto da regra previsto neste ato normativo é o seguinte:
“Art. 14. A prestadora deve manter na área de prestação do serviço, pelo menos, um centro de atendimento que ofereça atendimento pessoal, de forma presencial, por correspondência e telefônico.
- 1. O atendimento pessoal, de forma presencial, ao assinante, deve: a) estar disponível, pelo menos, nas localidades onde exista ponto de venda do serviço ofertado pela prestadora; b) ser prestado por pessoa devidamente qualificada para receber, interagir , orientar, informar, esclarecer e encaminhar para solução qualquer solicitação, em especial: I – contestação de débitos; II – solicitação de reparo, III – emissão de segunda via do documento de cobrança; IV – restabelecimento do serviço e V – correção de endereço e outros dados”.
Como se observa, a agência reguladora do setor trata normativamente do direito ao atendimento presencial nos serviços de TV por assinatura. Aqui, faz-se necessária a visão crítica da insuficiência da regra federal, pois o problema é delimitar o direito ao atendimento pessoal tão-somente às localidades aonde exista ponto de venda do serviço ofertado pela empresa. Ou seja, na hipótese da inexistência de ponto de venda com presença física em uma localidade, por exemplo, nas operações de TV por assinatura na modalidade satélite, cujas vendas dos pacotes de serviços sejam por telefone, o assinante não terá direito ao atendimento presencial.
[13] A Constituição, ao tratar da competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal, dispõe o seguinte:
“Art. 24. (…).
- 1 No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
- 2 A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.
- 3 Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
- 4. A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contário.
[14] Na hipótese de afirmação da incidência da regra da competência legislativa concorrente, deve-se verificar se a Lei federal 12.485/2011, que trata dos serviços de televisão por assinatura, contém norma geral sobre o tema e se a lei estadual é compatível com a lei federal. Como já referido, a lei federal não trata diretamente do assunto. O tema é abordado em ato normativo federal representado pela Resolução 488/2007 da Anatel. Daí a questão em saber se a lei estadual do Paraná pode validamente suplementar a matéria do direito ao atendimento nos serviços de televisão por assinatura, sem ferir a competência legislativa concorrente, na hipótese da incidência do art. 24, inc. V, da Constituição.
[15] É uma interpretação constitucional mais inovadora e alinhada à visão de um federalismo cooperativo e de equilíbrio normativo entre os entes federativos. Sobre esta questão do federalismo brasileiro, é sempre necessária a consulta a Raul Machado Horta. Vide: Tendências atuais do federalismo brasileiro. In Revista de Direito Público. RDP 64/15, out./dez. 1982, publicado em Doutrinas essenciais de direito constitucional: Clèmerson Merlin Clève e Luís Roberto Barroso organizadores. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 232-248. E, ainda, segundo Pelayo Manuel Garcia: “A repartição de competências é a técnica que, a serviço da pluralidade dos ordenamentos do Estado Federal, mantém a ‘unidade dialética de duas tendências contraditórias: a tendência à unidade e a tendência à diversidade”. In Derecho constitucional comparado. Alianza Universidad, Madrid, 1987, p. 218, citado na obra de Raul Machado Horta, acima identificada.
[16] A favor desta tese o enquadramento legal, no respectivo marco regulatório dos serviços de comunicação audiovisual de acesso condicionado no regime privado. Não é aplicável, portanto, à hipótese os argumentos relacionados aos serviços públicos de titularidade da União.
[17] Esta outra interpretação alinha-se à visão tradicional da matéria à luz de uma concepção do federalismo centralizado. Daí porque se prevalece esta interpretação constitucional a ineficiência da regulação federal em defesa dos usuários não autoriza a intervenção estadual, não retira a competência regulatória da União.
[18] Em resumo, ou a afirmação da incidência do art. 21, inc, XI ou a sua negação para o efeito de incidência do art. 24, inc. V, da Constituição. A alternativa de uma terceira via de conciliação dos contrários ainda depende de construção doutrinária e jurisprudencial.
[19] E, também, lateralmente, a temática proporciona o necessário e oportuno debate da articulação entre a regulação federal, por intermédio da agência reguladora das telecomunicações, e o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor.
Revista dos Tribunais Sul, v.2, p. 43 – 51, 2014.
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