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5G

Nova política pública dos Estados Unidos para ampliar a conectividade digital por internet banda larga: lições para o Brasil

por Ericson Scorsim

set 21, 2021

Os Estados Unidos aprovaram a política pública de internet por banda larga. A medida foi adotada no contexto da renovação da infraestrutura de conectividade digital, no denominado Infrastructure Bill.  O Congresso norte-americano sensível à crise econômica derivada da pandemia do coronavírus, em ato bi-partidário, aprovou o pacote de benefícios para garantir o acesso à internet por banda larga.  

O objetivo é reduzir a exclusão digital, um obstáculo à competividade econômica dos Estados Unidos, bem como à distribuição equitativa de serviços públicos essenciais, incluindo-se saúde e educação. No momentum que o Brasil está para definir o edital do leilão de frequências para o 5G é oportuna a compreensão da regulação adotada pelos Estados Unidos, daí algumas lições podem ser extraídas. 

Segundo a lei norte-americana, a exclusão digital, desproporcionalmente, afeta comunidades de cor, áreas de baixa renda e áreas rurais, sendo que os benefícios da internet por banda larga deveriam ser desfrutados por todos. A lei norte-americana prevê a outorga de empréstimos pelo governo federal aos estados para o desenvolvimento de redes de internet por banda larga às áreas que não possuam acesso a internet por banda larga confiável, em velocidade entre 25 (vinte e cinco) a 3 (três) megabits. Esta é uma das grandes novidades na regulação do governo federal, isto é, a  articulação entre o governo federal e os estados nos programas de conectividade por banda larga.

O tema da conectividade digital é compreendido como uma questão da federação norte-americana, razão para a cooperação entre a União e os Estados. A lei norte-americana prevê o mapa das redes de banda larga no País. Também, define as áreas de alto custo, como aquelas não servidas pelos prestadores de conexão à internet por banda larga. Há a previsão do programa de acesso com equidade nas redes de banda larga (Digital Equity Act). Há a previsão de fundos públicos para o financiamento dos projetos de acesso à internet por banda larga. Existe a estipulação da opção de serviços de internet por banda larga de baixo custo para o público de baixa renda, mediante subsídios federais.

Neste contexto, a Federal Communications Comission, autoridade regulatória das telecomunicações, apresentará relatórios sobre o fundo futuro de serviços universais relacionados à internet por banda larga.  A FCC não poderá reduzir a autoridade do Congresso quanto ao alcance dos serviços universais de banda larga.  Há estipulação de conectividade paras as comunidades indígenas. No Digital Equity of 2021, parte integrante da referida lei, equidade digital é a condição individual e comunitária de acesso à capacidade das tecnologias de banda larga de modo a possibilitar a participação na sociedade e economia dos Estados Unidos. Inclusão digital é condição necessária para todas as pessoas dos Estados Unidos terem acesso, utilizar e disporem de tecnologias de informação e comunicação.

O termo Digital Literacy significa as habilidades associadas à utilização da tecnologia que capacita os usuários para encontrarem, avaliarem, organizarem, criarem e comunicarem informação. O Departamento de Comércio organizará o Programa de Empréstimo de Capacitação dos Estados em Equidade Digital. Os Estados deverão apresentar o plano de equidade digital, a fim de receberem os recursos. Por outro lado, há incentivos à infraestrutura de banda larga na “milha média”, o que inclui fibras óticas, bachaul, pontos de troca de tráfego de internet, cabos submarinos, data centers, redes sem fio, acesso a torres de rádio, links de micro-ondas, etc. Há a definição dos requisitos dos projetos de oferta de banda larga no varejo. A entidade beneficiária com o empréstimo de “milha média” deverá compartilhar a rede com terceiros, oferendo no mínimo velocidades de 1 (hum) giga por segundo. Há regras especiais para a disponibilidade de internet no período da situação emergencial da pandemia de covid.

O órgão controlador do governo deverá avaliar o impacto do acesso à internet por banda larga nos próximos 5 (cinco) e 10 (dez) anos nos seguintes aspectos:  a disseminação da banda larga nos negócios; o trabalho remoto e gerenciamento de negócios de casa, videoconferência, ensino à distância, hospedagem em casa e armazenamento de dados em computação em nuvem. Há parte específica sobre “digital discrimination”. Assim, os usuários têm o direito tem o direito de se beneficiar de igualdade de acesso aos serviços de internet por banda larga. Por isto, deverão ser apresentados relatórios ao Congresso sobre as medidas para evitar a discriminação digital no acesso à internet por banda larga, baseado nível de renda, raça, etnia, cor, religião ou nacionalidade de origem. Por fim, há o denominado Telecommunications Workforce Act.

Neste aspecto, o grupo de trabalho interagências em telecomunicações apresentará, juntamente com o Secretário do Trabalho, recomendações para atender as demandas da força de trabalho relacionado à indústria de telecomunicações, incluindo-se as demandas para construir e manter a infraestrutura sem fio de redes 5G, identificando-se as potenciais políticas e programas que possam melhorar a coordenação entre as agências federais e Estados, e entre Estados e as necessidades da força de trabalho em telecomunicações. Estas lições dos Estados Unidos sobre a democratização do acesso à internet por banda larga são valiosas para o Brasil.

Há alguns pontos a serem destacados: i) a articulação entre governo federal e governos estaduais quanto à política de conectividade digital por banda larga, inclusive mediante a concessão de empréstimos federais da União para os Estados; ii) os planos de serviços de internet banda larga com subsídios para a oferta de planos de baixo custo para os grupos de usuários de baixa renda; iii) o programa de equidade digital para possibilitar a inclusão digital; iv) os programas de educação digital, entre outros; v) os programas de treinamento da força de trabalho em telecomunicações.   No momento, o Brasil está para definir as regras do leilão do direito do uso de frequências de 5G. Portanto, é uma excelente oportunidade para a ampliação das políticas de inclusão digital, de modo favorecer o acesso à internet por banda larga para todos, em todo o território nacional.

O atual design do formato do edital do leilão de 5G tem alguns aspectos positivos, porém outros negativos. Seu formato atual não conseguirá promover a integral conectividade digital por banda larga em todo o País. É um modelo que certamente trará vantagens para empresas e novos modelos de negócios. Mas, no aspecto do usuário final (pessoa física), vejo certos obstáculos quanto à acessibilidade do 5G em larga escala. Por isto, entendo necessária uma política pública de telecomunicações mais radical, no sentido de radicalizar a conectividade digital por banda larga para todos, em todo o País. Mas, há um problema regulatório devido às limitações do modelo de autorização administrativa. A internet não é um serviço público, mas um serviço privado subordinado ao regime de autorização pela Anatel. Acredito que um modelo de coexistência entre a declaração de “serviços universal” do serviço de internet por banda larga poderia contribuir para a democratização do acesso à conectividade digital. Por estas razões, vejo que não há uma política regulatória de telecomunicações à altura dos desafios, riscos e oportunidades trazidos pela tecnologia 5G.

Há oportunidades geopolíticas e geoeconômicas para que o Brasil poderia melhor aproveitar, para se inserir na cadeia global do 5G. Mas, para isto acontecer é necessária liderança geoestratégica e vontade política, algo que não existe no atual momentum do País.

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Ericson Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do Livro Jogo Geopolítico no 5G: Estados Unidos, China e impacto no Brasil, Amazon, 2021, Autor da Coleção de Livros sobre Direito da Comunicação.